Estava refletindo, depois de tantos anos gerindo recursos de terceiros, que tipo de atitude é a mais importante em termos de aplicações. Assim como dizem que para escolher um imóvel três coisas são importantes – localização, localização e localização -, ficou muito claro para mim que, no caso de gestão de recursos, é preciso disciplina, disciplina e disciplina. Mas o que significa ter disciplina de investimento?
Acho que dá para escrever um livro sobre esta definição… Mas, por hoje, vamos assumir que significa cumprir aquilo que foi planejado para o investimento. Não cair em modismo, não ficar mudando de estratégia a cada sinal contrário, não se “apaixonar” pelo investimento e, entre outras tantas coisas, não correr riscos inadequados. Não estou falando aqui de longo ou curto prazo nem de ser conservador ou agressivo, mas apenas de ter consistência de objetivos e estratégias de investimento ao longo do tempo.
Para tentar tornar o conceito menos árido, vamos a um exemplo com fundos de ações. É muito comum ver gestores que em determinados momentos correm para ações que pagam bons dividendos, em outros buscam setores com alto potencial de crescimento, em outros empresas cíclicas e assim por diante. Este tipo de gestão acaba sendo apreciado porque mostra dinamismo e boas histórias de investimento. O problema é que geralmente cria pouco valor no longo prazo, pois a inconsistência de estratégia gera a necessidade de brilhantismo para estar sempre acertando qual a melhor estratégia do momento.
Simplificando o raciocínio, não seria mais consistente comprar sempre as ações baratas independente do setor ou se ela paga, ou não, dividendos? Nesta linha, lá fora já existe há algum tempo estratégias como a GARP (“growth at a reasonable price“, ou crescimento a um preço razoável). A premissa é sempre buscar um balanceamento entre crescimento e valor, criando consistência de longo prazo. Nada aqui contra os fundos especializados como “small caps”, dividendos ou setoriais. O meu ponto é contra a inconsistência de estratégia.
Outro exemplo pode se valer da piada do mercado financeiro que diz que o investimento de longo prazo é a especulação que não deu certo. Quando se entra em um investimento, o objetivo de retorno tem de ser maior ou pelo menos igual à possível perda. Estatisticamente, se você faz investimentos assimétricos (com possibilidade de perda maior do que seu objetivo de ganho), no longo prazo você perde. É a mesma teoria da roleta no cassino: você pode até ganhar às vezes, mas quanto mais você joga, mais chance tem de perder porque a banca tem um número a mais a seu favor, o zero.
Com disciplina de investimento é como se o zero estivesse do seu lado. No exemplo, se o investidor era de curto prazo (especulador) e tinha um objetivo de ganho de 5%, a perda jamais poderia superar este limite, pois antes disso ele deveria desfazer seu investimento. O problema aqui é que, em geral, as pessoas têm grande dificuldade em realizar prejuízo, portanto, tornam-se, como diz a piada, investidores de longo prazo. Por outro lado, quando há ganho, existe uma ansiedade grande por colocá-lo no bolso. Para vencer o psicológico, só mesmo com disciplina.
Em meu tempo de private banking conheci vários clientes que ganharam muito dinheiro graças à disciplina de investimento. Cada um com a sua estratégia, uns muito agressivos e concentrados, outros devagar e sempre. O que me chamou a atenção, porém, foi que realmente não existe uma fórmula, uma estratégia boa ou ruim. A consistência e disciplina é que fez o “zero” ficar do lado deles no longo prazo.
O cliente private tem disciplina na prática, mas, em geral, não a possui de maneira realmente estruturada. No caso do gestor, isso tem de ser estruturado, deve ter seu processo decisório mapeado via um documento. Ele deve ser capaz de explicar o porquê de cada decisão e seu processo deve ser replicável. Resumo da ópera: minha sugestão é que, longe das emoções do mercado, você descreva quais critérios usará para selecionar cada ativo em sua carteira. Coisas como liquidez, objetivo de rentabilidade, riscos e perdas aceitas, horizonte etc. Agora que está escrito, siga o que escreveu nos bons e maus momentos de mercado e garanto que esta atitude será vencedora.
* O artigo escrito por Paulo Corchaki, diretor de gestão de recursos da Itaú Asset Management, e publicado no jornal Valor Econômico.
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Como sempre falamos em nossas palestras, existem três fatores primordiais para o sucesso nos investimentos: planejamento, para definir a estratégia a ser seguida; disciplina, para cumprir a risca o que foi planejado; e equilíbrio, para balancear os desejos e anseios do presente com os planos para o futuro. Todos os três são importantíssimos, e se você falhar em algum desses pontos, certamente sua estratégia também sucumbirá.